Você SA – julho/2018 – O silêncio que ofende
Muito temos falado sobre ética e respeito na Gestão de Pessoas nos últimos anos. Vejo que temos avançado em algumas dimensões, mas uma prática continua sendo justamente a antítese desses desejos. O tal do feedback no processo seletivo. A representação fiel da famosa frase “casa de ferreiro, espeto de pau”.
Atuei como responsável pela área de recrutamento e seleção diretamente e depois como gestor das áreas de RH de grandes empresas. Sei que o tema não é tão simples, mas creio muito que podemos evoluir colocando foco, processo, SLAs (service level agreements), e principalmente, compromisso e vontade dos recrutadores em fazer da forma certa e respeitosa.
Eu mesmo já falhei em vários processos como esses. Mas, tenho absoluta certeza de que já acertei muito mais. Já estive do lado do candidato muitas vezes e tive ótimas experiências mesmo quando o feedback não era positivo. Como tive também péssimas experiências de muitas vezes não ter nenhum retorno. E olha, como dizem por aí, eu em todas essas ocasiões ocupava uma posição importante em alguma empresa grande. Aqui vale muito aquele ditado que diz: “faça com o outro aquilo que você gostaria que fizessem contigo”. Afirmo que vale esse ditado porque creio que cem por cento das pessoas gostariam de ter esse feedback. E merecem ter. Independente de qualquer posição, para qualquer nível na hierarquia das empresas, todos merecem esse respeito.
Incomodado com esse cenário, com o passar do tempo, passei a testar algo que foi me ajudando muito a dar valor ao candidato e poder interagir com eles derrubando alguns mitos. Procurava trabalhar com a posição de que estava ali mais para trabalhar para o candidato do que para a empresa que eu representava. Um erro de avaliação de contratação para a empresa pode ser muito ruim. Para um candidato, pode ser desastroso. Então, com esse compromisso assumido muitas vezes, buscava a confiança através de outro posicionamento importante. De que não existe candidato perfeito. O mais próximo da perfeição para mim é aquele que tem noção correta de suas forças e de seus gaps. Que tem maturidade e confiança para apresentá-los abertamente. A partir daí, investir numa boa entrevista, ir captando os pontos do candidato e se permitir ir trocando com ele durante a entrevista. Varias vezes, mesmo em alguns pontos aparentemente negativos, os candidatos constroem junto com você a sua avaliação e facilitam o feedback ao fim da entrevista. Isso mesmo. Um feedback ao fim da entrevista. Não necessariamente assegurar que será aprovado ou reprovado. Mas, um feedback que dê ao candidato a reciprocidade de um presente importante para o desenvolvimento e carreira dele.
Um dos meus momentos mágicos nessa dimensão ocorreu em 2015, quando eu estava à frente da Vice-Presidência de Gestão, Pessoas e Excelência da Dasa. Eu e minha partner Tayuan Bonomo na época na condução da avaliação da etapa final do programa de trainees, havíamos dado a notícia de que metade da turma havia passado e metade não. Naquele momento, tive um insight e ofereci aos não aprovados que eu iria dar um feedback individual aos que quisessem. Surpreendentemente, todos quiseram ficar e, por mais que tenha sido difícil lidar com a frustração deles, foi uma experiência memorável. Se o candidato investe tanto tempo para ir a sua empresa, se temos plena confiança de que atuamos profissionalmente e com competência para avaliar, por que temer dar pessoalmente o feedback? Tenho certeza de que, apesar da dor, eles também não devem se esquecer desse dia.
O título dessa matéria é de crédito de Fabio A.R. Moura. Ele fez essa observação num post que fiz no LinkedIn sobre o tema. E me tocou profundamente. É um silêncio que ofende pela enorme falta de respeito presente ainda em (péssimas) experiências que algumas empresas e contratantes oferecem a seus candidatos. Mas, creio muito que podemos e devemos melhorar esse aspecto dos processos seletivos. É uma bandeira que defenderei mais e que conto com vocês também. Todos ganham. Como se diz no Vale do Silício, se a maré aumenta, aumenta para todo mundo.